A imensa procura pelos brindes
Excelente ambiente, magnífico espaço e um público internacional garantem um balanço muito positivo para o 1.º Optimus Primavera Sound no Porto. Nem a chuva de sábado conseguiu estragar a festa.
Nem
a chuva de sábado abalou a ideia de que a 1ª edição do Optimus
Primavera Sound, no Porto, valeu a pena. Pelo ambiente, magnífico, com a
maior audiência estrangeira num festival português (50% da totalidade
dos espectadores diários eram provenientes de 40 países) a dar um
colorido descontraído ao recinto. Pelo lugar, o Parque da Cidade,
aprovado por todos, público e bandas.
Pela aposta num conceito onde,
mais do que a saturação (de meios, de marcas, de estímulos), importa a
relação transparente com o público. Pelo número de espectadores (cerca
de 25 mil por dia), que superou as expectativas iniciais. E, claro, pela
música.
Se na primeira noite
registaram grandes concertos, sexta e sábado ouve-os em abundância. Pela
diversidade e número de propostas, este é o tipo de festival onde cada
um terá a sua própria narrativa do sucedido. Dificilmente se encontrará
um número alargado de pessoas que chegue a algum consenso sobre os
melhores momentos. Sinal de cartaz equilibrado.
Com
quatro palcos a funcionar, ou se optava por ver apenas o que já se
conhecia, ou deambulava-se pelo espaço, vendo alguns concertos na
íntegra, mas na maior parte das vezes parcialmente. Escolhemos a segunda
hipótese. Na sexta, confessamos, o único que vimos do início ao fim foi
o dos Beach House. Pensávamos ficar só até meio, para vermos ainda os
The Walkmen, mas não conseguimos, pois foi brilhante o concerto do duo
americano, agora coadjuvado por um baterista.
O responsável é Bloom, o
novo álbum, onde aperfeiçoam a sua linguagem, colocando-a ao serviço de
canções de intensidade emocional. Ao vivo, impõem agora um tipo de
ambiente mais saturado, com voz, teclados, guitarra e elementos rítmicos
mais puxados para cima. Mesmo quando as canções pediam algum recato, a
assistência mostrava saber as letras de cor. Foi emocionante, com
Victoria Legrand esticando ao limite os vocais, enquanto a guitarra
ecoava uma e outra vez pela tenda.
Vários festivais num só
Este
foi um festival com vários festivais. Quem gosta de sentido de
espectáculo, com ironia e barroquismo, não se deve ter sentido
desiludido com o canadiano Rufus Wainwright e os americanos Flaming
Lips.
O primeiro veio apresentar o novo álbum, Out Of The Game, mas foi
quando puxou dos galões do passado que entusiasmou. Teatral, como
sempre, dedicou Greek song à Grécia, sentou-se ao piano, atacou uma
versão de Hallelujah e até foi buscar uma canção do pai, o cantor folk
Loudon Wainwright. Apesar de já não ter a mesma vitalidade, ainda é
capaz de conquistar uma plateia que parecia não ser sua.
No primeiro dia não faltou o sol
Público
é o que não falta ao excêntrico Wayne Coyne e aos seus Flaming Lips,
que apresentaram um espectáculo aparatoso, com bolas de espelho, jovens
eufóricas de ambos os lados do palco, confetti e o habitual número do
cantor a circular pela cabeça dos espectadores dentro de uma bolha. A
música tanto vai do rock psicadélico com requintes opulentos ao lirismo
mais sôfrego, resultando numa prestação desequilibrada, mas que satisfez
os admiradores mais empenhados.
Quase nos
antípodas estão os que se revêem numa certa pureza rock, temperada por
irónica rebeldia, como a dos americanos Black Lips e Thee Oh Sees, que
tocaram para um público entusiasmado com o seu rock nervoso.
Para
visões mais clássicas do rock alternativo, eis os históricos Yo La
Tengo, que têm tanto de experimentação como de inteligibilidade, e os
Wilco, com um espectáculo exigente, entre o apelo mais popular e a
divagação à beira do improviso, com a música de raiz country ou folk a
encontrar-se com rock.
Uma das supresas veio
dos The Chairlift, em parte pela presença contagiante da cantora
Caroline Polachek. Com uma sonoridade pop que não tem receio de procurar
ângulos inusitados, como se comprova pelo óptimo álbum Something, os
nova-iorquinos são ao vivo ainda mais vibrantes do que em disco. A sua
música tem tanto de acessibilidade como de estranheza, num fluxo
contínuo de energia.
Dançar de madrugada
E
o ambiente no recinto? Magnífico. Às vezes toda a gente se senta na
relva, como aconteceu no concerto dos Tennis, outras vezes, madrugada
fora, dança-se ao som dos franceses M83, que vão da massa ruidosa do
rock ao frenesim electrónico.
No sábado, a
chuva apareceu com intensidade e os Death Cab For Cutie não actuaram.
Atitude diferente tiveram os noruegueses Kings Of Convenience. A chuva
já tinha acalmado, mas o som de um outro palco teimava em intrometer-se
na sua música.
Em vez de virarem costas às contrariedades,
assumiram-nas. E o público rendeu-se. Inicialmente, com a multidão quase
silenciosa a ouvir a sua filigrana folk.
Depois vieram mais três
músicos a interagir com a assistência, e esta a cantar as letras de cor.
Foi bonito.
Já no palco ATP, os Dirty Three
propunham uma catarse para violino, bateria e baixo, com Warren Ellis na
habitual performance de fisicalidade caótica. No mesmo palco, surgiram
os Forest Swords e os Demdike Stare, com a electrónica futurista do
Reino Unido. E soube bem. Em particular os primeiros, com um baixista e
um programador de sons em sintonia numa música sombria pós-burial.
Indefiníveis
são os The Weeknd do canadiano Abel Tesfaye. A música parece
enquadrável algures entre o R&B, o hip-hop e a electrónica. No
entanto, não o é. Em disco, parecem um grupo de laboratório; em palco,
apresentam um dinamismo surpreendente, com a voz em falsete de Abel
sempre entrecortada por guitarras ruidosas e um balanço poderoso. Nem
nós, que gostamos muito, esperávamos tanto.
A
maior desilusão terão sido os Saint Etienne, os
Spiritualized, embora tenham a enorme atenuante de terem actuado
quando a chuva era intensa deram um bom concerto.
Sem grandes
artefactos cénicos e com uma presença contida mas autêntica, os The xx
voltaram a conquistar. E não optaram pelo mais fácil. Apresentaram
algumas das canções do álbum Coexist, a lançar em Setembro, e passaram
em revista o seu único álbum, com todas as canções a serem reconhecidas
ao primeiro acorde.
É esse efeito de reconhecimento - no som minimal mas
penetrante e na postura introvertida mas verdadeira - que cria pontes
com o público, dando origem a um clima especial nos concertos.
No dia seguinte, Domingo, na Casa da Música e no Hard Club, já em fim de festa, ainda houve
concertos.
E para o ano, garantiu a organização, haverá mais. Ainda bem,
porque foi um excelente festival. Valeu mesmo a pena.
Não custa
acreditar que, no próximo ano, o desafio seja crescer de forma
sustentada, sem desvirtuar o equilíbrio que se sentiu nesta 1.ª edição.
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