18/05/2012

IAN CURTIS - DEBORAH CURTIS

Carícias Distantes Deborah Curtis, 1995



Para além de ficarmos a conhecer a vida do artista e de a relacionarmos com a sua obra, uma biografia serve também para nos ajudar a desconstruir a imagem que criamos sobre a separação entre a obra e o artista. O quanto é difícil separar o autor, enquanto ser humano da sua criação.

 Ainda por cima se for escrita pela viúva do visado, que foi traída e deixada durante a relação.

 Deborah Curtis foi a última pessoa a ver o seu marido com vida. Analisada ao nível mais básico, a sua memória é um exorcismo da perda, da culpa e da confusão que se seguiu após o acto de violência [o suicídio de Ian Curtis.

Dissabores à parte, não é possível ficar indiferente a alguns incidentes tristes que Deborah Curtis conta sobre o marido Ian Curtis.

 InfânciaAinda Ian era um miúdo e já sobressaía em relação aos outros: tinha um invulgar amor pelos livros e uma avidez por aprender. Do pai herdou a escrita e o gosto pelos estados de espírito silenciosos.  Ao contrário dos outros miúdos, Ian levava as suas actividades muito a sério e rapidamente criou uma equipa de futebol chamada Spartan. O seu gosto pela antiguidade grega ajudou-o na escolha do nome.


JuventudeIan exercia um efeito contraditório sobre as pessoas que o rodeavam: ora atraía ora rejeitava. A par dos livros, Ian adorava a música e passava muitas horas a ouvir MC5, Roxy Music e Velvet Underground.
A maior parte dos heróis que admirava, como Jim Morrison, estava morto. Curtis demonstrou desde sempre um grande interesse e fascínio pela morte: «Ele costumava escolher algumas canções e letras como ‘Speed child, don’t want to stay alive when you’re twenty-five’ -, ou o tema de David Bowie ‘Rock ‘n’ Roll Suicide’ e deixava-se arrastar pelo romantismo mágico de uma morte prematura.» (p. 30); «Ian em especial deliciava-se com as vidas torturadas, retratadas nas canções dos Velvet Underground; toda a música que não manifestasse uma certa tristeza, violência ou talvez uma batalha contra moinhos de vento, era ignorada.» (p. 77)

Dostoiewski, Nietzsche, Sartre, Hermann Hess e J. G. Ballard eram os autores que mais lia. Todo o seu tempo livre era ocupado a ler ou pensar no sofrimento humano.
Apesar das drogas que desde cedo o acompanharam, Ian teve sempre boas notas na escola e raramente parecia estudar. Para além da adoração da morte e das drogas, o futuro vocalista dos Joy Division também se auto-mutilava: «As drogas que tomava obliteravam-lhe os sentidos e Ian costumava frequentemente infligir dor a si próprio, para ver quanto é que aguentava naquele estado anestésico. Utilizava cigarros para queimar a pele e batia na perna com os pitons de um sapato de corrida.» (p.32)


A relação com Deborah Curtis
Deborah e Ian conheceram-se quando eram ainda muito jovens. Deborah conta que nos primórdios da relação, Ian começou desde logo a tomar conta da sua vida: obrigava-a a vir almoçar a casa da sua mãe; não lhe permitia que andasse de mini-saia e se maquilhasse; inquiria-a sobre os homens que trabalhavam com ela; controlava todas as suas amizades, etc. O ciúme possessivo de Ian, levava-o a cometer actos mais extremos: numa festa atirou à cara de Deborah um Bloody Mary por ela já estar tocada pelo álcool e andar a dançar. Ou nas eleições, pressionava-a a votar no mesmo candidato, caso contrário, o seu voto anularia o de Ian.
Apesar de tudo isto, a viúva conta que o marido tinha muito bom coração: «A solidão e o silêncio pareciam fazê-lo feliz, e era nessas ocasiões que ele se mostrava mais amoroso e encantador.» (p. 49)



Joy DivisionÀ medida que o sucesso dos Joy Division crescia, os ataques epilépticos de Ian Curtis aumentavam. Chegava a ter ataques durante os espectáculos, ensaiando uma espécie de dança estranha que era entendida pelos fãs como parte do espectáculo.
Devido à doença, Ian sempre evitou pegar na filha, Natalie, pois tinha medo de ter um ataque, deixando-a cair. Deborah considerou-o sempre um pai ausente.

Ian Curtis tinha uma fascínio por tudo o que era alemão. 'Joy Division' era o que os nazis chamavam às prisioneiras mantidas vivas, para serem usadas como prostitutas pelo exército alemão. Quando Ian lhe contou isso, Deborah pensou que a banda queria glorificar a degradação das mulheres mas acabou por se acostumar à ideia que só tinham escolhido o nome para chamar as atenções.
Por muito que custasse aos membros da banda, Ian Curtis era a alma dos Joy Division: «Quer a banda gostasse ou não, Ian Curtis era a principal atracção do show da Joy Division». (p. 139)
Durante os concertos dos Joy Division, Ian Curtis conhece uma fã - Annik Honoré - que se tornará sua amante. A relação entre Deborah e Ian deteriora-se e ele chega-lhe a pedir o divórcio.



O Fim
O livro acaba com a trágica história do suicídio de Ian, a 18 de Maio de 1980, um dia antes dos Joy Division partirem para a sua primeira digressão nos Estados Unidos da América. Os acontecimentos que precederam a sua morte são já conhecidos do grande público. Depois de um ensaio que visava a digressão americana, Curtis foi para casa e viu Stroszek, do cineasta alemão Werner Herzog, filme onde um músico de rua troca a sua Alemanha pelos EUA, em busca do sonho americano, mas acaba por achar melhor suicidar-se. Mais tarde Curtis foi para a cozinha, colocou The Idiot de Iggy Pop a tocar e enforcou-se com os lençóis da cama. Num bilhete de despedida para a mulher deixou a música Love will tear us apart que viria a ser a mais famosa música dos Joy Division.


 Ian Curtis continua a ser, no nosso coração, o mesmo?. Ficamos a conhecer melhor o homem mas quando se ouve Joy Division, sente-se e pensa-se o artista. Ainda que a biografia se concentre mais na personalidade de Ian também ajuda a conhecer melhor a formação e evolução dos Joy Division.

 Carícias Distantes é claramente um livro sobre a vida e relações de Ian Curtis.

Pela internet existem muitos comentários de fãs que odeiam Deborah Curtis e chegam a afirmar que ela nunca compreendeu verdadeiramente Ian. Outros acham que esta personalidade é que torna o cantor interessante. Quem tem razão não interessa.


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