15/11/2010

MATTEO PERICOLI -The City Out My Window: 63 Views on New York

Vista desafogada, argumento tão do agrado dos vendedores de casas portugueses, não é o forte deste livro, "The City Out My Window - 63 Views On New York", que revela o que os nova-iorquinos vêem quando olham para fora das janelas. Aqui é a cidade do seu dia-a-dia, a sua vida profissional, e os seus devaneios.

A paisagem esbarra sempre em qualquer coisa. A ligação pessoal que cada um de nós tem para com a cidade, e da maneira em que as coisas que são simplesmente ali, coisas que nós não criamos, mas que nós olhamos o tempo todo, pode ter um efeito profundo em nosso ser.

Foram precisas 640 horas de trocas de olhares, quando se despedia do apartamento em Manhattan onde viveu durante sete anos, Matteo Pericoli fez a estimativa ao tempo que passou à frente da janela do quarto/escritório e decidiu que tinha de levar aquela vista - uns vulgaríssimos telhados entalados entre enormes edifícios - para a casa nova.

Desenhou-a, nascendo ali uma ideia e uma obsessão. "Em conversas formais ou informais, comecei a perguntar às pessoas o que viam das suas janelas e qual era a importância dessas vistas no seu quotidiano".
Resultado: desenhou mais cem, que, depois de uma selecção, dariam origem ao livro "The City Out My Window - 63 Views On New York", publicado recentemente nos Estados Unidos.

"É como ver Nova Iorque pelos olhos de outras pessoas, uma história da cidade mais íntima, vista pelos seus habitantes", explica o autor. E que habitantes: a famosa vocalista e viúva Rosanne Cash, o chef / TV Mario Batali, neurologista e escritor Oliver Sacks,o poeta Meghan O'Rourke, EL Doctorow, John Berendt, Richard Meier, as vistas dos humildes aposentos do ex-Talking Heads "lead singer/bicycle advocate" David Byrne, a fotógrafa Annie Leibovitz, o escritor Tom Wolfe ou do bailarino Mikhail Baryshnikov. Todos lhe abriram a porta do apartamento, escritório ou estúdio com uma única restrição (sugerida pelo próprio Pericoli): não identificar a localização exacta dos sítios.

Bom, todos menos um: o porteiro do último estúdio de Saul Steinberg (ilustrador conhecido pelos seus trabalhos para a "The New Yorker" que morreu em 1999). "Foi a mais difícil de conseguir. Achei que a devia ter no livro porque a sua visão sobre a cidade sempre foi muito interessante. Através da Fundação Saul Steinberg descobri onde foi o seu último estúdio, mas quando fui lá para falar com os actuais proprietários o porteiro não me deixou entrar. Achou uma invasão de privacidade. Mais tarde, soube que o estúdio estava à venda e marquei uma visita. Nada feito: o porteiro reconheceu-me e barrou-me a entrada outra vez. Tive que pedir à minha mulher e a um amigo para irem lá fotografar a vista."

Para as outras, o ritual foi sempre o mesmo: entrava, esperava que o anfitrião lhe indicasse a vista preferida, tirava 30 a 50 fotografias em 15 minutos e ia para o estúdio reproduzir as imagens ao seu gosto. Nem a insistência de Annie Leibovitz o convenceu a abrir excepções: "Queria que usasse fotografias da vista tiradas por ela. Disse-lhe que este projecto tinha uma abordagem diferente."

A da cantora country Rosanne Cash tem sorte: essa "qualquer coisa" que está no seu campo de visão são o Empire State Building e o Hotel Chelsea, dois marcos da cidade. O compositor Philip Glass contenta-se com ares-condicionados, reservas de água e telhados. David Byrne espreita lá para fora e apanha ocasionalmente os vizinhos a olharem para ele.

O humorista Stephen Colbert tem à sua frente um arranha-céus de uma empresa de telecomunicações que o fazem pensar em cancro. Vistas idílicas? Só a do actor Steve Martin, que dava para o Central Park, mas foi excluída das 63 do livro: "Não surpreendia, era aquilo que se esperava", justifica Pericoli, para quem a vista de uma casa é "das coisas a que se dá menos importância, mas das que mais afectam o nosso dia-a-dia, é a nossa ligação ao mundo"

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