12/11/2010

FRANKO B

Para alguns, Franko B não passa de um artista gótico com gosto gore e masoquista. Já houve, no público que assiste às suas performances, quem se insurgisse gritando bem alto que aquilo não é arte. Mas muitos artistas têm usado sangue nos seus trabalhos, por vezes de forma figurativa. Franko tem a integridade moral e artística de usar o seu próprio sangue para se exprimir artística e ideologicamente.

Franko B nasceu em Milão em 1960, vive em Londres desde 1979 e é assumidamente gay. O seu trabalho abarca desde a pintura, escultura, fotografia, vídeo, instalação e performance. Estudou em Londres no Camberwell College of Arts e no Chelsea College of Art. Actuou e expôs em instituições de renome como a Tate Modern e apresentou trabalhos em vários continentes. Foi objecto de três monografias: Franko B (1998); Oh Lover Boy (2001) e Blinded by Love (2006) e publicou o projecto fotográfico Still Life em 2003, para o qual passou dois anos a fotografar os sem abrigo de Londres enquanto dormiam.

Os seus trabalhos mais conhecidos e controversos são as séries em que se mostra nú, pintado de branco e sangrando: «queria trabalhar com sangue mas não podia usar o sangue de outra pessoa. Não uso sangue de animal nem trabalho com sangue falso porque não estou interessado em teatro. É como se o corpo fosse uma tela e o sangue a tinta. É o mesmo procedimento como se estivesse a dar sangue, só que eu sangro numa tela. Faço estas performances porque me fazem sentir vivo». É importante frisar que o médico pessoal de Franko está sempre presente num canto do palco, durante as suas exibições que nunca são mais do que três por ano, para que o seu corpo recupere.

As performances mais conhecidas são I Miss You, Oh Lover Boy e Aktion 398. Em I Miss You, Franko, pintado de branco, desfila para trás e para a frente numa passarelle forrada com um tecido branco e de ambos os braços, cateteres vertem o seu sangue. É uma imagem que se torna um forte contraponto aos desfiles de moda com as suas manequins elegantes e sorridentes.

Oh Lover Boy mostra Franko pintado de branco, também com cateteres nos braços. Franko abre e fecha consecutivamente as mãos, impulsionando o sangue a sair em corrente, desenhando fios no branco dos seus braços e da plataforma. Os braços caídos ao longo do corpo vão formando no chão duas poças de sangue. Com as palmas das mãos viradas para cima e perdendo sangue, Franko perde também força. Já de joelhos envolto numa nuvem de giz, Franko mistura no chão pigmento branco com o seu sangue e começa a rastejar. Agarra num trapo e enfia na boca para estancar o sangue até que acaba por ter um colapso e cai de cara no chão. Aparentemente morto, ele é levado para os bastidores pelos seus assistentes.

Aktion 398 é talvez o trabalho mais impressionante porque é também o mais intimista e aquele que obriga o público a ser mais do que mero espectador com gosto gore. Numa sala branca, Franko proporciona aos seus espectadores encontros de dois minutos cara-a-cara. Recebe-os pintado de branco e com uma ferida aberta na barriga, como se fosse uma apendicectomia. As pessoas reagem de formas muito diferentes quando se fecham com ele na sala. Algumas fogem ou não se conseguem aproximar, outras querem cumprimentá-lo ou falar do seu dia. Algumas querem até tocar na ferida. Mas à saída todos sentem que quem está sob escrutínio é o visitante e não o artista. Franko consegue uma situação em que o espectador fica numa posição frágil, sem regras, nem sequer de etiqueta.

Para se perceber melhor a posição de Franko, pode ver-se no You Tube um documentário: Art Shock:The Human Canvas, realizado pela Tearecords para o Channel 4 sobre artistas que usam o próprio corpo como manifestação artística, em que Franko fala das suas motivações.

A partir da série I Miss You, Franko recolheu os tecidos com manchas do seu sangue e pô-los em telas, onde ainda podemos ver as marcas ensanguentadas dos seus pés ou das mãos e pingos de sangue que compõem uma forma abstracta que por vezes parece os testes de Rorschach. «Tenho trabalhado com objectos domésticos encontrados, que embrulho com telas ensanguentadas das minhas performances como I Miss You. Também tenho feito pinturas com telas ou com os toalhetes de bebés que uso para me limpar depois das performances. Neste momento, todo o trabalho é resultado de reciclagem de diferentes tipos. Cobrindo os objectos encontrados, que foram deitados fora, dou-lhes uma nova existência fazendo-os meus ou simbolicamente dando-lhes amor e uma nova casa».

Franko B decidiu recentemente interromper a série de performances que incluem sangramento e procura outras formas de expressão criativa desafiadoras, incluindo a pintura. Continua, no entanto, a experimentar os limites das performances. No seu ultimo trabalho Don’t Leave Me This Way, em colaboração com o designer de iluminação Kamal Ackarie, Franko está sentado numa cadeira, nú, o seu corpo enorme, carregado de tatuagens e cicatrizes, num estrado alto em frente a uma vasta audiência. As luzes dirigidas para o público, aumentam até encadear a audiência obrigando–os a olhar fixamente tentando descortinar o palco. Esta técnica mima o efeito que as performances de sangue de Franko B têm no público. A audiência parece espantada. Franko deixa que os espectadores toquem e vejam o seu corpo. Em www.createdinbirmingham.com/2007/05/18/fierce-franko-b/, pode ver-se uma animação com esta performance e ter uma melhor percepção do seu impacto.

O corpo de Franko está coberto por tatuagens que parecem contar uma história. Nas anteriores performances em que se pintava de branco, estas tatuagens, ainda em construção, eram escondidas, mas em Don’t Leave Me This Way, as tatuagens são assumidas e até contribuem para a performance. Uma dessas tatuagens, a cruz vermelha que ele usa como símbolo e como assinatura, significa protecção. Começou a usá-la como metáfora de que todos somos refugiados. Também usa muito o coração como forma de dizer que todos precisamos também de amor, não só de protecção. É interessante que um artista que quase se esvazia de sangue em frente a um público e se expõe numa posição de enorme vulnerabilidade, considere que o mais importante é sermos amados e protegidos.

O seu mais recente trabalho em pintura é a série The Black Period, que inclui também alguma escultura, nomeadamente o modelo do próprio Franko, sentado numa cadeira segurando uma caveira. Mas são trabalhos que estão muito longe do impacto e das questões que ele levanta nas suas performances.

Para além de todas estas manifestações artísticas que Franko usa para se exprimir, ainda é DJ e está disponível para ser contratado para alegrar festas.

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