Quando, em 1992, Donna Tartt, publicou "A História Secreta", um primeiro e extenso romance recheado de referências literárias, tornou-se best seller,traduzido mais tarde em 24 línguas. O livro foi considerado como um exemplo da recuperação da grande tradição da ficção russa, de Tolstoy a Dostoievsky.
A personalidade de Tartt contribuiu para o verdadeiro "culto" a que esta obra estava destinada. A sua diminuta figura - "sou exactamente do tamanho de Lolita e, em pequena, vestiam-me roupas de boneca", afirmou numa entrevista - o cabelo cortado à Louise Brooks, sotaque sulista, uma postura de reclusa e a firme decisão de se dedicar inteiramente à escrita, pondo de lado o casamento ("Je ne vais jamais me marier,"), a juntar ao facto de ser amiga de Bret Easton Ellis, fizeram dela um ícone do universo literário.
" A História Secreta" abre com duas citações: um "sofisma" de Nietzsche e um passo da "República" de Platão que exorta a que se contem histórias "aos nossos heróis" para que eles "se eduquem". São ecos de autores ilustres como Sterne - a citação em grego de Epictetus na primeira página de "Tristram Shandy" que quer dizer algo como "os homens são perturbados não pelas coisas mas pela opinião que têm das coisas" - e como Fielding que, em "Tom Jones", vai buscar à "Ars Poetica" de Horácio, a frase, "ele conheceu os costumes do mundo", a adaptação latina da primeira linha da "Odisseia" de Homero, que refere a sabedoria adquirida por Ulisses/Odisseus. Está dado o mote para a acção, com ecos de tragédia grega. A autora começa com um prólogo chocante e violento, um artifício que irá repetir no seu segundo romance, "The Little Friend"(2002). O leitor fica a saber que houve um crime e quem o praticou. Depois, a câmara faz um "zoom" para o que aconteceu oito anos antes, uma técnica utilizada por escritores de thrillers psicológicos, como James Ellroy e Henning Mankell.
À primeira vista, a trama parece improvável: quatro alunos de Cultura Clássica do Hampden College em Vermont - uma zona elitista da Nova Inglaterra - influenciados pelo professor Julian Morrow, levam a cabo uma celebração dionisíaca durante a qual, matam e desmembram um camponês local, numa cena que recria o acto de Pentheus, em "As Bacantes" de Eurípides. O crime é descoberto por outros dois estudantes do grupo: Edmund ("Bunny") Corcoran, que inicia uma descontrolada acção de chantagem, principalmente na pessoa de Henry, o líder carismático, e Richard Pappen, o narrador.
Helena Vasconcelos
Uma história densa, perturbadora e arrepiante que combina a densidade psicológica dos personagens e o vigor poético de um texto clássico com uma trama complexa e um ritmo alucinante.
A História Secreta não é um policial, nem um romance negro, nem verdadeiramente um drama psicológico, é tudo ao mesmo tempo e é isso precisamente que o torna um romance tão fascinante. O crítico A.o. Scott etiquetou-o “um mistério do assassinato no reverso.”
Este livro, que data de 1992, foi o primeiro romance de Donna Tartt. Para além deste “A História Secreta”, em Portugal foi também publicado “O Pequeno Amigo”, igualmente pela Dom Quixote. Para além destes dois livros, a autora publicou algumas histórias curtas e trabalhos fora da ficção.
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