Passam hoje 30 anos desde que morreu o mítico vocalista dos Joy Division.
É impensável imaginar a cultura pop das últimas três décadas sem a figura de Ian Curtis. Porquê? Só nos últimos dez anos vimos nascer uma série de grupos que certamente não teriam sido os mesmos se, por mero acaso, Curtis nunca se tivesse juntado a Peter Hook, Bernard Sumner e Stephen Morris e formado os Joy Division. Dos Interpol aos Bloc Party, passando pelos Editors, Mount Sims ou The National, todos incorporam claras influências do grupo nascido em Manchester no final dos anos 70.
No entanto o músico só precisou de gravar dois álbuns com os Joy Division para marcar para sempre os caminhos da música popular. Não é por isso de admirar que o tema Love Will Tear Us Apart, o maior sucesso do grupo, uma das mais belas e tristes canções de sempre, se tenha tornado numa das canções que mais vezes foi reinterpretada por outros nomes que não os Joy Division, dos Smashing Pumpkins aos Nouvelle Vague até aos portugueses Moonspell.
Nos últimos anos vimos também um despontar de filmes centrados na figura de Ian Curtis e/ou da banda em que se celebrizou. Em 2008 chegou às salas de cinema o documentário de Grant Gee simplesmente intitulado Joy Division. Como seria de prever, este título faz um percurso pela história dos quatro músicos de Manchester que, segundo reza a lenda, depois de verem um concerto dos Sex Pistols a 4 de Junho de 1976, decidiram formar uma banda.
Ian Curtis, Bernard Sumner, Peter Hook e um primeiro baterista, Tony Tabak, apresentaram-se pela primeira vez em público a 29 de Maio de 1977 no Electric Circus como Warsaw.
Primeiro com o nome Warsaw (inspirado no tema Warsawa de David Bowie, do album Low), e mais tarde adoptando o nome Joy Division.
Se o documentário de Grant Gee se foca na história do grupo, já Control (2007), realizado por Anton Corbijn, é concretamente um biopic de Ian Curtis, baseado na biografia escrita pela mulher do músico, Debbie,(feita pela actriz inglesa Smantha Morton, de "Minority report"),que também assina a co-produção. Os dois se casaram muito jovens e tiveram uma filha, a qual ele ignora solenemente no filme.
E, mesmo afirmando seu amor pela jornalista amadora Annick Honoré, Curtis não consegue ficar longe de Debbie. Ao saber da amante, ela ameaça com o divórcio, mas ele pede para ela desistir - Carícias Distantes foi editado em Portugal em 1996 com tradução de Ana Cristina Ferrão.
"Control" também passa longe do estereótipo "sexo, drogas e rock and roll". Curtis, de facto, carrega na mochila os seus frascos de remédios, mas para tentar conter sua epilepsia. E a única cena de sexo se passa debaixo do cobertor e termina com Curtis chorando, talvez atravessado pela culpa da traição.
Entre as dúvidas do coração, o sucesso stressante da banda e os constantes ataques epilépticos, Curtis (amava David Bowie, Iggy Pop e Lou Reed) enforca-se na cozinha de sua casa, após assistir a "Woyzek", de Werner Herzog, um dia antes do embarque dos Joy Division para a primeira tourné nos Estados Unidos, e antes do segundo disco da banda, "Closer", ter chegado às lojas.
Somando tudo isso, o péssimo marido com o abandono da banda em pleno auge, o filme desconstrói o mito Ian Curtis, um jovem um tanto depressivo e egoísta.
O filme foi exibido no Festival de Cinema de Cannes deste ano, em Maio, um dia antes do aniversário de 27 anos da morte de Curtis. O baterista Stephen Morris contou aos jornalistas no festival como se sentiu quando soube que Curtis se enforcara:
"Acho que foi um choque, mas o que eu senti foi muita raiva -raiva por ele ter sido tão estúpido", disse. "Quando uma pessoa comete suicídio, deixa um monte de perguntas sem resposta para as pessoas que sobram- e as fere muito mais."
O actor britânico Sam Riley, nascido em 1980 (fez de Mark E. Smith, dos Fall, em "24 hour..."). interpretou o músico que se suicidou nesse mesmo ano, é também cantor e guarda uma estranha semelhança com Curtis, inclusive quando dança no palco, um transe parecido com seus ataques epiléticos. Já a história de Anton Corbijn não se faz sem referir os Joy Division, uma vez que o holandês é não só autor de algumas das fotografias mais emblemáticas do grupo, como chegou mesmo a realizar um teledisco para Atmosphere, oito anos depois da morte de Curtis.
O seu suicídio é um daqueles momentos que se tornou lenda na história da cultura pop. Ninguém pode afirmar ao certo as razões que o levaram a tomar essa decisão nas vésperas dos Joy Division iniciarem uma digressão pelos EUA e que significaria também um "salto" para um maior mediatismo. E como várias vezes já aconteceu na história da música popular, foi somente depois da trágica morte do cantor que os Joy Division começaram a ter uma maior projecção global.
A última vez que Curtis actuou ao vivo foi na Universidade de Birmingham, a 2 de Maio de 1980, duas semanas antes da sua morte. Digital foi o último tema interpretado por Ian Curtis. Os Joy Divison preparavam-se para a sua primeira digressão internacional
Não são raros os casos de músicos que assumem publicamente que não teriam sido os mesmos sem ouvir Ian Curtis. Inclusivamente em Portugal. Basta recordar as palavras de Pedro Oliveira, vocalista da Sétima Legião, que chegou mesmo a dizer: "Ouvi-o (Ian Curtis) cantar e aquilo mudou a minha vida".
A importância que o músico e os Joy Division tiveram na cultura popular, muito pela reinvenção pop de que foram responsáveis, foi claramente registada em 2002 no filme 24 Hour Party People, de Michael Winterbottom. O filme foca-se essencialmente no movimento musical que nasceu em Manchester no final dos anos 70 à volta da editora Factory, e mesmo que os Joy Division só tenham existido até ao dia da morte de Curtis, eles foram dos grandes protagonistas do que então se viveu.
1 comentário:
Uma memória em legado eterno.Sem tempo para os comentários do costume. Residents, foste a algum concerto europeu?
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