29/07/2009

Merce Cunnhingham foi o maior coreógrafo do século XX

Com a sua companhia, Cunningham marcou a evolução da dança, estabelecendo uma relação muito particular com as artes plásticas e com a música contemporânea, nomeadamente com a obra de John Cage, com quem começou a trabalhar em meados da década de 40, numa parceria que só viria a terminar com a morte do compositor americano, em 1992. “Merce revolucionou as artes visuais e performativas, não em busca da iconoclastia, mas da beleza e maravilhamento que decorrem da exploração de novas possibilidades”, acrescenta a nota emitida pela Cunningham Dance Foundation e pela Cunningham Dance Company.O dançarino e coreógrafo nascido em Centralia, Washington, em 1919,estudou dança e teatro no Cornish College of the Arts, em Seattle, e entre 1939 e 1945 foi bailarino solista da Companhia de Dança Martha Graham. Formou no Verão de 1953 a Companhia de Dança Merce Cunningham, e coreografou quase 200 obras para a ela. Os seus trabalhos já foram apresentados pelo Balet da Ópera de Paris, pelo New York City Ballet, o American Ballet Theatre e o Balet de Boston. "É preciso amar a dança para continuar com ela", disse Cunningham, segundo seu site na Internet, www.merce.org. "Ela não lhe devolve nada: nenhum manuscrito para guardar, nenhuma tela para expor na parede ou talvez em museus, nenhum poema a ser impresso e vendido, nada exceto aquele único instante fugaz em que você se sente vivo." Entre as homenagens e os prémios que Cunningham recebeu estiveram o Prémio Dorothy and Lillian Gish, a Medalha Nacional de Artes, o Prémio Laurence Olivier, de Londres, e o título de Oficial da Legião de Honra da França. Continuou a trabalhar como bailarino até mais de 80 anos, também trabalhou com cinema e vídeo, e colaborou com os cineastas Charles Atlas e Elliot Caplan. A sua coreografia mostrava que o principal da dança é a própria dança, não a música, mas frequentemente sugeria que ela podia dizer respeito a muitas outras coisas também. Ainda que remetido a uma cadeira de rodas, Cunningham tinha feito, no início do mês de Junho – já depois de ter celebrado o seu 90º aniversário, a 16 de Abril –, o anúncio do programa que decidira preparar para a sua companhia no West Village de Nova Iorque, para quando ele não a pudesse dirigir pessoalmente, ao então para depois da sua morte: realizar uma última digressão mundial de dois anos e, depois, extinguir-se. “Tenho tido sempre na minha cabeça o movimento físico do ser humano”, disse o coreógrafo no momento do anúncio dessa tournée, a que deu o título Herança Viva. “A carreira de Merce caracteriza-se pelo seu desejo constante de ultrapassar fronteiras e de explorar novas ideias”, disse também nessa altura Trevor Carlson, director executivo da Fundação que tem o nome do coreógrafo que chegou a ser designado o “Nijinski americano”. Merce deixou uma marca indelével na criatividade e cultura colectiva; o seu legado vai ecoar no mundo da dança para além dele e durante gerações ainda por vir. O bailarino e coreógrafo, João Fiadeiro afirmou que Cunnhinghan "foi um artista absolutamente central" na criação contemporânea, ao lado de John Cage na música, e Marcel Duchamp na pintura. Para Fiadeiro estes três criadores constituem "um triângulo genial". "Não podíamos falar do muito que hoje falamos sobre a dança contemporânea se não fosse o trabalho de Cunnhingham", foi Merce Cunnhingham "quem abriu as portas, que olhou para o mesmo problema de sempre de um outro ângulo, que trouxe uma nova perspectiva" disse Fiadeiro. "Por exemplo - explicou - foi um gesto revolucionário ao referir-se à posição 'arabesque' tal como ela é: uma perna atrás das costas". "Ele fez-nos ver o essencial, e o facto de ter dito isto desta forma, em que enunciou apenas a ideia, foi revolucionário", acrescentou. João Fiadeiro afirmou que a sua geração "a nova dança portuguesa, francesa, belga, a dança contemporânea em geral deve muito ao Mercê Cunnhingham que juntamente com Pina Bauch eram dois pilares que se compensavam. Eles trabalham em formas distintas e tinham formas de lidar com a dança e com o tempo diferentes, mas ambos contribuíram para que a dança fosse mais do que narrativa". Para Rui Horta, Cunningham " reposicionou" o papel do corpo na dança.É uma grande perda para a área da dança", avaliou o também bailarino e coreógrafo português, em declarações à Agência Lusa a propósito do desaparecimento do histórico criador. Cunningham "é um personagem incontornável da dança do século XX, tal como Pina Bausch [falecida no final de Junho], Trisha Brown e William Forsythe", considerou o coreógrafo que trabalha habitualmente com artistas no Convento da Saudação, em Montemor-o-Novo. "São sem dúvida as grande figuras da dança do século XX - vincou - os grandes pilares desta área", disse, antes de comentar que a morte de Pina Bausch foi "inesperada e mais chocante", enquanto que no caso do coreógrafo norte-americano, devido à idade, não foi uma surpresa. "Se Pina Bausch trouxe a dimensão teatral à dança, Merce Cunnhingam trouxe a dimensão da abstração. Ele desligou o corpo de uma narrativa e deixou para cada espectador o ónus da descodificação do gesto e do movimento".

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